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sábado, outubro 28, 2006

Distintas definições de exigência (sobre o aborto)

Imaginem que vivíamos num país onde a participação cívica compunha o quotidiano de cada um de nós. Um país onde a exigência reinava nas nossas mentalidades, na nossa cultura. Um país onde se trocavam os sofás, comandos de televisão e respectivas massas cinzentas estagnadas, por experiências altruístas, boletins de voto carregados de vontades e espírito crítico especialmente atento.

Imaginem que optávamos por emendar erros na sua fonte e não no seu resultado. Imaginem que em vez de votarmos na despenalização do aborto, sujeitávamos o Estado a cumprir as suas responsabilidades sociais. Que em vez de caminharmos pelo caminho mais pragmático e cheio de feias cicatrizes psicológicas, seguíamos pela construção de estruturas de amparo a mães desprotegidas que davam sorrisos de responsabilidade e encargos, mas, também, de inequívoca felicidade.

Imaginem que em vez de aborto clandestino tínhamos programas de acompanhamento social e psicológico, assim como um Estado que dedicava os seus inúmeros cêntimos ao estímulo da economia e à criação de emprego em detrimento de outros tantos “direitos adquiridos” que de direitos têm tão pouco, que mais parecem obrigações. Imaginem que o crime de aborto em vez de um remédio penal tinha um tratamento psicológico e social. Que se trocavam condenações por auxílio directo.

E que para isto tudo acontecer, bastava o cidadão exigir, cumprir com os seus direitos e reclamar a eficiência de um Estado. Bastava que ele próprio agisse e abortasse com o seu comodismo egoísta.

Poderão apelidar esta imaginação de quimérica, mas que dizer do delírio daqueles que defendem o SIM?

Aqueles que acreditam que a vergonha (no sentido de intimidade legítima) e as razões económicas se irão vergar perante a despenalização e assim terminar com a clandestinidade. Aqueles que acreditam na capacidade do SNS para prontamente responder a esse novo “serviço”, sem encaminhar ninguém para o clandestino, quando se encontra atolado em tantas outras tarefas.

Aqueles que acreditam que todos os contribuintes têm de vedar o amanhã a um ser vivo sem lhe dar qualquer oportunidade de vingar na vida. Aqueles que acreditam que assim estão a proteger e a emancipar a mulher, deixando-a entregue à pressão “legal” de quem até agora, e mal, nunca foi chamado a intervir: o homem.

Aqueles que acreditam que o futuro é por aqui, sem perceberem que a vida jamais poderá cair no prato de uma balança que do outro lado apenas tem pesos supérfluos, passíveis de serem repetidos e facilmente transponíveis desde que haja vontade. Aqueles que vêem o futuro sem pararem para pensar nas alternativas que poderão vir a desperdiçar sob a forma de vida.

E nestes dois cenários uma diferença substancial existe: no primeiro exige-se do Estado, pois é para isso que foi criado, enquanto que no segundo exige-se daqueles que defesas ainda não têm, muito menos para exigir a vida!

|| JMC - João Maria Condeixa, 03:50

13Comentários:

Muito bem João, é isso mesmo.
A discusão deveria ser como melhorar as condições do Planeamento Familiar e desburocratizar os processos de adopção, nunca se deveria de discutir um valor como é o da VIDA HUMANA.

Abraço
Blogger James Aurens, at 10:53 da manhã  
Cachão,
Por acreditar que ninguém recorre ao aborto, excepto em circunstâncias limite, é que acho que quem o fez precisa de ajuda a ultrapassar essas mesmas circunstâncias.E acredita que essas pessoas que conheces que o fizeram e não tiveram qualquer tipo de ajuda psicológica vão, no futuro, sentir muito a sua falta, pois as feridas ficaram lá!
Quanto às restantes circunstâncias de cariz económico e social, apenas julgo que compete ao Estado promover o desaparecimento desses problemas e não o desaparecimento de fetos! A prioridade devia ser diferente. Em relação às pessoas que não passam nenhuma destas situações limite e mesmo assim recorrem ao aborto, digo-te, sinceramente, que não as percebo e que é delas que quero proteger a vida!E agora permite-me uma pergunta: por cada problema que não consegues resolver à primeira, abres o peito e aceita-lo como uma virtude?
Blogger JMC - João Maria Condeixa, at 1:31 da tarde  
Pois bem, gostaria de deixar a questao no ar... Desde quando se pode considerar que um ser vivo é um ser vivo? Desde que dia após a fecundacao, o punhado de células aglomeradas que formam um ser vivo podem ter o nome de bebe? A pilula do dia seguinte esta a matar um bébé??? Quando eu tenho o periodo estou a abortar meio bébé?
Quantas criancas (cuja mae nao pode abortar por ser ilegal) foram adoptados por militantes da JP?
Eu gostaria de viver num país onde as pessoas que sao contra coisas inevitáveis (como os abortos de quem nao tem posses socio economicas ou mentais) me provassem que o NAO é sustentável através dos seus próprios exemplos...
Gostava de viver num pais onde as pessoas que sao pelo NAO me mostrassem que participam activamente pelo futuro destes "Nao abortos" e que lhes podem dar tudo o q eles necessitam para poderem sobreviver...

J.D.
Anonymous Anónimo, at 2:44 da tarde  
Cara JD,
Em relação às tuas primeiras perguntas,onde incluo "Quando eu tenho o periodo estou a abortar meio bébé?" aconselho-te a escrever para a Maria...
Já à segunda parte, posso-te dizer que conheço muitas instituições e muitas pessoas que independentemente do partido ou ideologia de origem, tentam diariamente dar alternativa a esta questão e que são: "ajuda de berço", "refugio aboim ascenção",APF, santa casa, etc...
Blogger JMC - João Maria Condeixa, at 3:58 da tarde  
Cachão,
apesar de não querer misturar dois assuntos tão distintos como a liberalização da droga e do aborto, ainda assim tenho-te a responder que o consumo das drogas leves aumentou e bastante, sobretudo na camada mais nova da juventude, os preços também aumentaram (não sei, sinceramente se foi consequência directa) e não acabaram com os traficantes! Logo o exemplo não foi o melhor, parece-me a mim!
Mas estamos totalmente de acordo num ponto: o Estado não pode restringir cada cidadão em prol da religião. Daí não abordar, eu, a questão do aborto por esse prisma!Como vês no post, as minhas razões para ser pelo "NÃO" são precisamente outras. Não tento impingir as minhas convicções religiosas a mais ninguém.Mas acho que uma cultura de exigência e menos facilitista para com o Estado poderia resolver muita coisa..
abraço
Blogger JMC - João Maria Condeixa, at 9:51 da tarde  
Uma criança, em gestação, resultado de uma violação merece a morte? Uma criança em gestação com deformação grave ou incapacitante merece a morte? Nestes casos a Lei permite o aborto. Os que defendem a vida pela vida deviam deixar-se de hipócrisias. Acham que se trata de ser pela vida ou ser pela morte? Acham que qualquer mulher faz um aborto de ânimo leve? Ou acham, como acha a inadjectivável Zita Seabra, que assim que despenalizado, o aborto permitirá às mulher recorrer a ele se não gostarem do sexo da criança?
Não sejam paternalistas. Trata-se de uma opção que diz respeito às mulheres em quem tem de se confiar. Quanto ao que fazemos nós isso já é outra conversa.
Não sou pelo aborto e não o faria mas sou a favor da despenalização das mulheres que, desgraçadas, o têm de fazer.
Voto sim, sem falsos moralismos.
Anonymous Anónimo, at 1:41 da tarde  
Caro anónimo, sem falsos moralismos devia votar "não", pois poderia despenalizar as mulheres sem liberalizar o aborto.Como vê no meu post também discordo das penas aplicadas, preferindo acompanhamento psicológico. Quanto à questão de violação tem aqui a minha resposta e só em caso extremos de doença, devo-lhe dizer, com perigo de vida para o feto e/ou para a mãe, é que vejo a interrupção como o mal menor.Acredito que ninguém seja pelo aborto, mas gostava mais de ver as pessoas a serem exigentes pelo Estado,pois seguramente constituíriamos alternativa a esse flagelo!
Blogger JMC - João Maria Condeixa, at 4:33 da tarde  
Parabéns JMC, gostei muito.
escrevi sobre isto aqui
abraços
Micha
Blogger michael seufert, at 5:26 da tarde  
Caro joao condeixa, gostaria de saber s também é pelo NAo da pilula do segundo dia...
Anonymous Anónimo, at 5:34 da tarde  
A pílula do dia seguinte impossibilita a implantação da mórula no endométrio ou antes mesmo da fecundação, impossibilita que o espermatozóide contacte com o óvulo impedindo a fecundação através da alteração do muco vaginal.Assim, no limite, impede a implantação de 64 células na parede interior do útero. Tal processo não me choca, sobretudo se souber que impede muitos outros problemas a jusante sem afectar um organismo, um órgão ou sequer um tecido, uma vez que as células ainda não se encontram especializadas. Pergunto agora: existindo a pílula do dia seguinte não devia haver mais pessoas pelo NÃO?
Blogger JMC - João Maria Condeixa, at 1:33 da manhã  
Carissimos.
Já vi crianças aos pedaços a sair pela vagina da mãe. Já vi crianças a morrer pelo cytotec no interior do útero materno e já vi muitas outras pessoas, novas e velhas, a morrer. Garanto que a morte mais horrivel é a das crianças no interior do útero materno. Ser a própria mãe a matá-las é dos piores crimes contra a vida. Mãe que mata filho dessa maneira não merece viver.
Anonymous Anónimo, at 1:55 da manhã  
Carissimos.
Já vi crianças aos pedaços a sair pela vagina da mãe. Já vi crianças a morrer pelo cytotec no interior do útero materno e já vi muitas outras pessoas, novas e velhas, a morrer. Garanto que a morte mais horrivel é a das crianças no interior do útero materno. Ser a própria mãe a matá-las é dos piores crimes contra a vida. Mãe que mata filho dessa maneira não merece viver.
Anonymous Anónimo, at 1:56 da manhã  
Oiço opiniões aqui e ali, mulheres a berrar que quem manda nas suas barrigas são elas, pessoas a defender que em situação nenhuma para além das legais servem de justificação para o aborto!
Não percebo como podem tomar uma posição tão marcada... É que para além de ser mulher, saber que nesta altura da minha vida, não me "daria jeito nenhum" ter uma criança, tanto por razões económicas como profissionais...Também já fui um feto de 8,9,10... semanas.
Entro em confronto comigo própria ao pensar que poderia colocar o aborto como ultima solução a uma gravidez não desejada!! Sei que no MEU caso (e não só no meu...) tratar-se-ia de um facilitismo...Já que ter um filho, é uma decisão vitalícia, já que aquele ser no futturo será o espelho do meio e das condições onde cresceu e se desenvolveu, acho que todos nós fazemos planos para os nossos futuros rebentos, e visionamos um fututo maravilhoso para os mesmos... no entanto tambem visionamos um futuro maravilhoso para nós próprios!!
É sabido que no desenvolvimento psico-social, segundo Piaget, está uma etápa pela qual todos nós passamos, (ou pelo menos deveriamos ter passádo), que é a capacidade de nos colocarmos no lugar dos outros...Creio que criminalizar as mulheres que recorreram em ultima estância ao aborto, não é solução! Mas tambem creio que a liberalização, apenas por iniciativa da mulher, para a interrupção do aborto é injusta! 8 ou 80?everything or nothing?
Eu?!Não sei... Eu?! não vóto... Se alguém me der algum argumento, que me faça tomar "partido de um dos ládos" agradecia, é que já falta tão pouco para o grande dia do juízo final...Obrigado
Anonymous Anónimo, at 12:22 da manhã  

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